Matemática e discalculia do desenvolvimento

Garota resolvendo um problema de matemática

Tópicos

Desenvolvimento

Desde o nascimento até o encontro com a matemática formal na escola, percorremos um longo caminho, onde a vivenciamos de forma constante e diversa. Das primeiras interações quando bebê até esse encontro, as conversas, as músicas, os brinquedos, as brincadeiras, estão permeados pelos elementos da matemática: formas, tamanhos, quantidades e ordens.

Os bebês nascem com a capacidade instintiva para diferenciar quantidades numéricas de forma aproximada. Esta capacidade é inata, universal e independente da linguagem. Também é verificada em adultos que não frequentaram ensino formal da matemática e em primatas não humanos. Chamamos de sistema de representação não-simbólico.

Quando a criança escolhe a sacolinha com mais doces, sem contar, usou sua capacidade instintiva de comparar e identificar quantidades, de forma rápida e aproximada. Continuamos a usar, quando escolhemos qual fila tem menos pessoas ou qual parte do metrô tem menos pessoas sentadas.

Com os estímulos do ambiente e o desenvolvimento da linguagem, as quantidades passam a ter nomes: uma cesta com 4 bolinhas pode receber os nomes “um, dois, três, quatro” e, com a mediação escolar, aprende-se também os algarismos “1,2,3,4”. Uma memória de algarismos e palavras correspondentes começa a se formar, ou seja, um sistema de representação simbólica.

A representação de quantidades, tanto não simbólica (bolinhas, por exemplo) quanto simbólicas (palavras e algarismos) devem ser precisas, acessadas de forma correta e usadas para cálculos e resolução de problemas. A conversão entre os tipos de representações é chamada transcodificação numérica.

Enquanto isso, a criança usa os dedos para contar, habilidade fundamental para resolver cálculos também. Vai formando-se, mentalmente, uma espécie de linha numérica, onde os números estão dispostos espacialmente e auxiliam na realização dos cálculos.

O ensino formal da matemática, a partir do primeiro ano do Ensino Fundamental, oferece à criança as estratégias como a operacionalização dos cálculos, tanto oral quanto escrito. A instrução dos professores e o desenvolvimento cognitivo fazem com que as crianças amadureçam suas estratégias e acessem de forma mais rápida e automática, tanto as representações, como possam efetuar os cálculos. Assim, o aluno usa os dedos, a linha numérica e sua linguagem para efetuar os cálculos e tarefas necessárias.

Identificar diferentes quantidades sem contar, assim como os processos de contagem, linha numérica e acesso à linguagem constituem a habilidade básica para aprendizagem da matemática e é chamada de processamento numérico, ou senso numérico.

Todo cérebro típico nasce com uma região responsável pelo senso numérico, localizada em uma parte do cérebro chamada córtex parietal, mais especificamente o sulco intraparietal.

Porém, outras áreas também são ativadas no cérebro, como o córtex temporal, envolvido no processamento da linguagem, e o córtex frontal, que trabalha nos cálculos e resolução de problemas.

Mais recentemente, e pesquisas mostraram que a capacidade de representação cerebral dos dedos está envolvida na contagem usando os dedos. Isto mostra a importância do uso dos dedos para a contagem, como processo de treino para posterior automatização dos processos de cálculo simples.

Pesquisadores de Stanford, ao estudarem as redes de interação no cérebro, especificamente ao resolver problemas de matemática, descobriram que mesmo quando trabalhamos em uma questão aritmética simples, cinco áreas diferentes do nosso cérebro estão envolvidas, e duas delas são rotas visuais. Juntamente com outros neurocientistas, eles descobriram que a comunicação entre as diferentes áreas cerebrais aumenta a aprendizagem e o desempenho.

As ideias matemáticas podem ser aprendidas não apenas através de números, mas também através de palavras, imagens, modelos, algoritmos, tabelas e gráficos; de movimentos e do tato; e de outras representações. No entanto, ao usar dois ou mais desses meios e promover a comunicação entre as diferentes áreas cerebrais responsáveis por eles, a experiência da matemática é potencializada.


A Base Nacional Comum Curricular

BNCC – define os conteúdos que devem ser aprendidos pelos alunos em cada série escolar. Com relação ao conteúdo da matemática, segue o quadro indicando o que é esperado:

COMPONENTE CURRICULAR MATEMÁTICA – 1º ANO
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HABILIDADESNÚMERO
EF01MA01Utiliza números naturais como indicador de quantidade ou de ordem em diferentes situações cotidianas e reconhecer situações em que os números não indicam contagem ou ordem, mas sim código de identificação. Reconhece situações em que os números não indicam contagem nem ordem.
EF01MA04Conta objetos de coleções até 100 unidades.
EF01MA02Utiliza estratégias de pareamento ou agrupamentos para realizar contagem.
EF01MA03Estima e compara quantidades de objetos de dois conjuntos (em torno de 20 elementos
EF01MA07Compõe e decompõe número de até duas ordens
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HABILIDADESGRANDEZAS E MEDIDAS
EF01MA15Compara comprimentos, capacidades ou massas, utilizando termos como mais alto, mais baixo, mais comprido, mais curto, mais grosso, mais fino, mais largo, mais pesado, mais leve, cabe mais, cabe menos.
EF01MA12Descreve a localização de pessoas e de objetos no espaço segundo um dado ponto de referência
EF01MA14Identifica e nomeia figuras planas (círculo, quadrado, retângulo e triângulo).
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HABILIDADESÁLGEBRA
EF01MA09Organiza e ordena objetos familiares ou representações por figuras, por meio de atributos, tais como cor, forma e medida
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HABILIDADESPROBABILIDADE E ESTATÍSTICA
EF01MA20Classifica eventos envolvendo o acaso, tai como “acontecerá com certeza”, “talvez aconteça” e “é impossível acontecer”, em situações do cotidiano.
COMPONENTE CURRICULAR MATEMÁTICA – 2º ANO
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HABILIDADESNÚMERO
EF02MA03Compara quantidades de objetos de dois conjuntos, por estimativa e/ou por correspondência (um a um, dois a dois, entre outros), para indicar “tem mais”, “tem menos” ou “tem a mesma quantidade”Indica quantos a mais e quantos a menos tem na comparação de dois conjuntos.
EF02MA05Constrói fatos básicos da adição e subtração.
EF02MA01Compara e ordena números naturais (até a ordem de centenas).
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HABILIDADESGRANDEZAS E MEDIDAS
EF02MA16Estima, mede e compara comprimentos de lados de salas (incluindo contorno) e de polígonos.
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HABILIDADESGEOMETRIA
EF02MA15Reconhece, compara e nomeia figuras planas (círculo, quadrado, retângulo e triângulo.
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HABILIDADESÁLGEBRA
EF02MA10Descreve um padrão (ou regularidade) de sequências repetitivas e de sequências recursivas, por meio de palavras, símbolos ou desenhos.
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HABILIDADESPROBABILIDADE E ESTATÍSTICA
EF02MA22Compara informações de pesquisas apresentadas por meio de tabelas de dupla entrada e em gráficos de colunas simples ou barras.
COMPONENTE CURRICULAR MATEMÁTICA – 3º ANO
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HABILIDADESNÚMERO
EF03MA02Identifica características do sistema de numeração decimal, utilizando a composição e a decomposição de número natural de até quatro ordens.
EF03MA01Lê, escreve e compara números naturais de até a ordem de unidade de milhar.
EF03MA05Utiliza diferentes procedimentos de cálculo mental e escrito para resolver problemas significativos envolvendo adição e subtração com números naturais.
EF03MA06Resolve e elabora problemas de adição e subtração com os significados de juntar, acrescentar, separar, retirar, comparar e completar quantidades.
EF03MA07Resolve e elabora problemas de multiplicação (por 2, 3, 4, 5 e 10) com os significados de adição de parcelas iguais.
EF03MA09Associa o quociente de uma divisão com resto zero de um número natural por 2, 3, 4, 5 e 10 às ideias de metade, terça, quarta, quinta e décima partes.
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HABILIDADESGRANDEZAS E MEDIDAS
EF03MA18Escolhe a unidade de medida e o instrumento mais apropriado para medições de comprimento, tempo e capacidade.
EF03MA19Estima, mede e compara comprimentos, utilizando unidades de medida não padronizadas e padronizadas mais usuais (metro, centímetro e milímetro.
EF03MA20Estima e mede capacidade e massa, utilizando unidades de medida não padronizadas e padronizadas mais usuais (litro, mililitro, quilograma, grama e miligrama).
EF03MA22Lê e registra medidas e intervalos de tempo, utilizando relógios (analógico e digital)
EF03MA24Resolve e elabora problemas que envolvam a comparação e a equivalência de valores monetários do sistema brasileiro em situações de compra, venda e troca.
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HABILIDADESGEOMETRIA
EF03MA13Associa figuras geométricas espaciais (cubo, bloco retangular, pirâmide, cone, cilindro e esfera) a objetos do mundo físico e nomeia essas figuras.
EF03MA14Descreve características de algumas figuras geométricas espaciais (prismas retos, pirâmides, cilindros, cones), relacionando-as com suas planificações.
EF03MA15Classifica e compara figuras planas (triângulo, quadrado, retângulo, trapézio e paralelogramo) em relação a seus lados (quantidade, posições relativas e comprimento) e vértices.
EF03MA12Descreve e representa a movimentação de pessoas ou de objetos no espaço, incluindo mudanças de direção e sentido, com base em diferentes pontos de referência.
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HABILIDADESÁLGEBRA
EF03MA11Compreende a ideia de igualdade para escrever diferentes sentenças de adições ou de subtrações de dois números naturais que resultem na mesma soma ou diferença.
EF03MA10Identifica regularidades em sequências ordenadas de números naturais, resultantes da realização de adições ou subtrações sucessivas, por um mesmo número.
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HABILIDADESPROBABILIDADE E ESTATÍSTICA
EF03MA27Lê, interpreta e compara dados apresentados em tabelas de dupla entrada, gráficos de barras ou de colunas.
EF03MA28Realiza pesquisa envolvendo variáveis categóricas em um universo de até 50 elementos
COMPONENTE CURRICULAR MATEMÁTICA – 4º ANO
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HABILIDADESNÚMERO
EF04MA01Lê, escreve e ordena números naturais até a ordem de dezenas de milhar.
EF04MA03Resolve e elabora problemas com números naturais envolvendo adição e subtração.
EF04MA06Resolve e elabora problemas envolvendo diferentes significados da multiplicação (adição de parcelas iguais, organização retangular e proporcionalidade).
EF04MA07Resolve e elabora problemas de divisão cujo divisor tenha no máximo dois algarismos.
EF04MA09Reconhece as frações unitárias mais usuais (1/2, 1/3, 1/4, 1/5, 1/10 e 1/100) como unidades de medida menores do que uma unidade, utilizando a reta numérica como recurso.
EF04MA10Reconhece que as regras do sistema de numeração decimal podem ser estendidas para a representação decimal de um número racional e relaciona décimos e centésimos com a representação do sistema monetário brasileiro.
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HABILIDADESGRANDEZAS E MEDIDAS
EF04MA20Mede e estima comprimentos (incluindo perímetros), massas e capacidades.
EF04MA21Mede, compara e estima área de figuras planas desenhadas em malha.
EF04MA22Lê e registra medidas e intervalos de tempo em horas, minutos e segundos em situações relacionadas ao seu cotidiano.
EF04MA23Reconhece temperatura como grandeza e o grau Celsius como unidade de medida a ela associada.
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HABILIDADESGEOMETRIA
EF04MA16Descreve deslocamentos e localização de pessoas e de objetos no espaço, por meio de malhas quadriculadas e representações como desenhos, mapas, planta baixa e croquis.
EF04MA17Associa prismas e pirâmides a suas planificações
EF04MA18Reconhece ângulos retos e não retos em figuras poligonais.
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HABILIDADESÁLGEBRA
EF04MA13Reconhece as relações inversas entre as operações de adição e de subtração e de multiplicação e de divisão.
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HABILIDADESPROBABILIDADE E ESTATÍSTICA
EF04MA27Analisa dados apresentados em tabelas simples ou de dupla entrada e em gráficos de colunas ou pictóricos.
COMPONENTE CURRICULAR MATEMÁTICA – 5º ANO
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HABILIDADESNÚMERO
EF05MA01Lê, escreve e ordena números naturais até a ordem das centenas de milhar com compreensão das principais características do sistema de numeração decimal.
EF05MA02Le, escreve e ordena números racionais na forma decimal com compreensão das principais características do sistema de numeração decimal.
EF05MA03Identifica e representa frações (menores e maiores que a unidade), associando-as ao resultado de uma divisão ou à ideia de parte de um todo, utilizando a reta numérica como recurso.
EF05MA04Identifica frações equivalentes.
EF05MA06Associa as representações 10%, 25%, 50%, 75% e 100% respectivamente à décima parte, quarta parte, metade, três quartos e um inteiro, para calcular porcentagens.
EF05MA07Resolve e elabora problemas de adição e subtração com números naturais e com números racionais, cuja representação decimal seja finita.
EF05MA08Resolve e elabora problemas de multiplicação e divisão com números naturais e com números racionais cuja representação decimal é finita (com multiplicador natural e divisor natural e diferente de zero.
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HABILIDADESGRANDEZAS E MEDIDAS
EF05MA19Resolve e elabora problemas envolvendo medidas das grandezas comprimento, área, massa, tempo, temperatura e capacidade, recorrendo a transformações entre as unidades mais usuais.
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HABILIDADESGEOMETRIA
EF05MA15Interpreta, descreve e representa a localização ou movimentação de objetos no plano cartesiano (1.º quadrante), utilizando coordenadas cartesianas, indicando mudanças de direção e de sentido e giros.
EF05MA16Associa figuras espaciais a suas planificações (prismas, pirâmides, cilindros e cones) e analisa, nomeia e compara seus atributos.
EF05MA17Reconhece, nomeia e compara polígonos, considerando lados, vértices e ângulos.
EF05MA18Reconhece a congruência dos ângulos e a proporcionalidade entre os lados correspondentes de figuras poligonais.
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HABILIDADESÁLGEBRA
EF05MA11Resolve e elabora problemas cuja conversão em sentença matemática seja uma igualdade com uma operação em que um dos termos é desconhecido.
EF05MA12Resolve problemas que envolvam variação de proporcionalidade direta entre duas grandezas, para associar a quantidade de um produto ao valor a pagar.
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HABILIDADESPROBABILIDADE E ESTATÍSTICA
EF05MA23Determina a probabilidade de ocorrência de um resultado em eventos aleatórios, quando todos os resultados possíveis têm a mesma chance de ocorrer (equiprováveis).
EF05MA24Interpreta dados estatísticos apresentados em textos, tabelas e gráficos (colunas ou linhas)

BRASIL, Ministério da Educação (MEC/SEED). Base Nacional Comum Curricular. Terceira versão – Versão Final. Brasília, 2017. Disponível em http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=79601-anexo-texto-bncc-reexportado-pdf-2&category_slug=dezembro-2017-pdf&Itemid=30192.


Dificuldades de matemática e discalculia

As dificuldades de matemática podem estar em três categorias:

  1. Pedagógicas/ambientais
  2. Específicas – Discalculia
  3. Decorrentes de outros transtornos

1. Pedagógicas/ambientais

Pais e professores deparam-se frequentemente com queixas de seus filhos/alunos relacionados à matemática. Sabe-se que a maior parte destas dificuldades são decorrentes de modelos pedagógicos não eficazes e outros fatores socioeconômicos e culturais. Dentre estes, podemos citar alunos expostos a conteúdos matemáticos sem terem desenvolvido as habilidades anteriores, e que não são vistas, indicadas para reforço ou instrução individualizada.

Nos Estados Unidos, existe uma prática no contexto escolar, recomendado pelas pesquisas científicas, que é o critério de resposta à intervenção (RTI), contando com 3 fases:

1ª camada: os professores são capacitados para o ensino de qualidade e fazem avaliações periódicas para observar evolução do aluno.

2ª camada: os alunos que falham na avaliação da primeira camada são indicados para o trabalho em pequenos grupos, em habilidades específicas, para depois serem reavaliadas.

3ª camada: os alunos que persistem em suas dificuldades são encaminhados para avaliação clínica.

Especialmente na cidade de São Paulo, várias escolas indicam seus alunos para “aulas extras”, em grupos menores, para focar na estimulação das dificuldades, o que é um passo muito importante para análise da evolução ou persistência das dificuldades.

2. Dificuldades específicas – Discalculia

Discalculia do desenvolvimento também é chamada de Transtorno específico de aprendizagem com déficit em matemática. Consiste em:

  • Dificuldades persistentes na aquisição e desenvolvimento das competências acadêmicas na área da matemática;
  • Presentes desde o nascimento;
  • Dificuldades específicas e não consequentes de alterações intelectuais e outros transtornos;
  • Não decorrentes de práticas pedagógicas ineficazes ou falta de oportunidade educacional.

As pesquisas são muito mais escassas do que a dislexia, outro tipo de transtorno específico de aprendizagem.

Neste quadro, dificuldades no processamento numérico caracterizam um desempenho onde o aluno:

  • Não identifica conjuntos com mais ou menos itens, sem usar contagem;
  • Usa dos dedos para cálculo simples, em estágios em que deveria ter automatizado os cálculos;
  • Erra a ordem dos números ao contar – 1,2,3,4,5,6,7,8,10;
  • Mostra dificuldade ao comparar quantidades numéricas – pode achar 265 menor que 56;
  • Não insere números na ordem e proporção adequada em uma régua numérica – escreve 5, 20,36,68, 76, 88 na ordem, mas entre o 1 o 50;
  • Erra na leitura de leitura – pode ler 807 como oitenta sete; ler 8 como 7;
  • Erra na escrita de números – pode escrever 1000804 para 1084.

Como consequência, tarefas que dependem do processamento numérico serão impactadas, pois a criança não desenvolveu as habilidades básicas ou a realizam com esforço, prejudicando os passos seguintes, como:

  • Realização de operações escritas;
  • Troca de sinais das operações;
  • Interpretação errônea dos problemas escritos – quando se lê de forma errada os números;
  • Erro nos resultados dos problemas – o esforço para cálculo faz o aluno perder informações.

Outras dificuldades, não relacionadas diretamente à matemática, podem ser observadas, como:

  • Sequências: por exemplo, ordenar por tamanho;
  • Senso e noção espacial: dificuldade para seguir mapas;
  • Noção temporal: horas e estimativa de tempo;
  • Quebra-cabeça: relação entre tamanhos e formas;
  • Lateralidade: direita/esquerda;
  • Ritmo e sequência motora.

3. Decorrentes de outros quadros

Há dificuldades de matemática como consequência de quadros como problemas de linguagem, dislexia, TDAH, deficiência intelectual.

3.1. quadros com déficits de linguagem

Durante o ensino formal da matemática, a criança começa a adquirir uma linguagem matemática, ou seja, aprende termos como NUMERADOR, DENOMINADOR, EQUAÇÕES, etc. Porém, antes disso, precisa ter estabelecido noções e conceitos, vivenciados na primeira infância. Segundo Menezes, “a linguagem matemática é híbrida, pois resulta do cruzamento da Matemática com uma linguagem natural, no nosso caso, o Português”. (1999, p. 4).

A linguagem natural tem um papel crucial no desenvolvimento das habilidades matemáticas. Noções como quantidade de elementos, tamanhos e formas são vistas e experimentadas pela criança desde o nascimento. Com a aquisição do vocabulário, a criança começa a nomear tanto os elementos como as diferenças entre os conjuntos e grandezas. Ou seja, precisa ter conhecimento mínimo e compreender a definição e uso de diversos termos. Quando falamos de conceitos, estamos falando de linguagem. A linguagem permite que as regras matemáticas sejam mais facilmente manipuláveis. Por exemplo:

  • Contagem dos elementos: nomes são atribuídos a cada item adicionado (um, dois, três, etc.);
  • Noções e conceitos de noção de quantidade como MAIS e MENOS (dez MAIS cinco);
  • Conceitos de IGUAL e DIFERENTE (três MENOS um é IGUAL a dois);
  • Conceitos de tamanho (pequeno, médio e grande) e noção de MAIOR e MENOR;
  • Conceitos de ordem (primeiro, segundo, terceiro, etc) e noção de ANTES e DEPOIS (quinze está ANTES do dezesseis);
  • Conceitos de espaço e lateralidade (dezoito MAIS vinte e nove = oito mais nove dá dezessete, ELEVA UM À ESQUERDA);
  • Termos das operações SOMAR, SUBTRAIR, MULTIPLICAR e DIVIDIR, REDUZIR.

Neste sentido, é importante a estimulação do desenvolvimento da linguagem oral. Veja aqui se seu filho está dentro do esperado para a faixa etária.

Também é necessário, quando uma criança tem dificuldade na matemática, considerar se teve um atraso no desenvolvimento da linguagem, se já passou por tratamento fonoaudiológico ou ainda se apresenta um diagnóstico de transtorno de linguagem. Veja mais aqui.

Como alguns déficits de linguagem podem comprometer o aprendizado da matemática:

  • Dificuldade de formar vocabulário (entender, memorizar o nome, acessar o nome) implica no aprendizado dos termos necessários como mais/menos, antes/depois, somar/subtrair);
  • Dificuldades fonológicas (com os sons da fala) apontam que os sons que formam os nomes não estão bem estabilizados (discriminar, acessar o nome, produzir o nome) dos números;
  • Dificuldade na compreensão de sentenças e textos prejudicam a compreensão de problemas matemáticos.

3.2. quadros com déficit na linguagem escrita

O desenvolvimento da leitura é crucial para o aluno ler os números, operações, equações e resolver os problemas. Nos primeiros anos do ensino fundamental, é necessário que a criança aprenda a fazer a decodificação e se torne cada vez mais fluente, ou seja, leia com velocidade adequada e entonação. A leitura precisa ser automática para que áreas cerebrais possam ser ativadas mais rapidamente para a interpretação.

Da mesma forma, precisam desenvolver a escrita para registro das resoluções e respostas.

É preciso muito cuidado, pois muitos pacientes chegam com queixas de dificuldades na matemática e a escola não percebeu que a leitura também não é fluente. Perguntas que precisam nortear o olhar do professor e do clínico:

  • O aluno lê com fluência adequada?
  • Precisa ler muitas vezes para entender?
  • Se o aluno lê fluentemente, compreende o que lê?
  • Se o problema matemático for feito oralmente, consegue resolver, mas se precisar ler, tem baixo desempenho?
  • Consegue resolver o problema falando, mas suas respostas escritas são incompletas?

Para saber mais sobre dificuldades na leitura acesse https://www.reescrevaclinica.com.br/o-que-e-dislexia-como-saber-se-voce-tem-e-o-seu-filho/ e dificuldades na escrita veja https://www.reescrevaclinica.com.br/dificuldade-na-escrita/.

3.3. Quadros com comprometimento nas funções executivas

As funções executivas são um conjunto de habilidades cognitivas que permitem ao sujeito engajar-se em comportamentos orientados a objetivos, realizando ações voluntárias, independentes, auto-organizadas e direcionadas a metas. São especialmente importantes diante de situações novas ou em circunstâncias que exigem ajustamento, adaptação ou flexibilidade do comportamento para as demandas do ambiente.

Dificuldades nas funções executivas podem impactar a aprendizagem da matemática de diversas formas. Veja alguns exemplos:

  • dificuldade para manter a atenção atrapalha a explicação dada pela professora;
  • alternar a atenção entre duas informações é importante para pensar na quantidade e associar um nome a ela;
  • no cálculo, é preciso manter as quantidades na memória visual e/ou verbal enquanto o aluno realiza o procedimento;
  • na leitura de um problema matemático, é necessário organização e sequência do que foi lido para resolvê-lo;
  • dificuldade no controle inibitório faz com que o aluno não ouça ou leia a instrução até o final;

As funções executivas desenvolvem-se mais lentamente na primeira infância, atingindo maior maturidade na pré-adolescência, e ainda segue em desenvolvimento. Por isso, os conteúdos na escola são direcionados de acordo com a capacidade da criança para organizá-los. É necessário que estejam bem desenvolvidas em séries mais avançadas, para que os alunos possam dar conta dos conteúdos matemáticos.

O Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade é um quadro onde frequentemente as funções executivas estão alteradas. Por isso, estes pacientes devem sempre ter atenção também ao desenvolvimento da Matemática.


Avaliação

Existem indicadores estatísticos que mostram grande parte dos alunos que apresentam problemas na aprendizagem matemática. Mas, como saber se estas dificuldades estão associadas ao método de ensino, desmotivação, desinteresse ou se deve a uma discalculia?

Para isso, a importância de uma boa e completa avaliação, tanto fonoaudiológica, quanto psicopedagógica, para verificar o nível de compreensão de leitura, dificuldades no processamento de informações, processamento auditivo, memória, como também a capacidade para aquisição de desenvolvimento das competências numéricas e matemáticas.

Na avaliação específica das competências numéricas e matemáticas, é necessário aplicar testes que englobem as diferentes áreas da discalculia, como:

  • Área Verbal

Dificuldades em compreender conceitos matemáticos, estabelecer relações de forma oral na nomeação das quantidades, nos termos, símbolos e relações matemáticas.

Ex.: observar se lê corretamente os números cardinais, ordinais, decimais e os símbolos (+, -, = , <, …)

  • Área Pratognóstica

Dificuldades na enumeração, comparação de objetos em relação ao tamanho, à quantidade e à ordem.

Ex.: conjuntos, interseção, pertencimento, ordem crescente e decrescente.

  • Área Léxica

Dificuldades na leitura dos símbolos matemáticos usados nos cálculos, nas fórmulas e na comparação de grandezas.

Ex.: correspondência de objetos e números, símbolos e sua aplicação.

  • Área Gráfica

Dificuldades na escrita dos símbolos matemáticos.

Ex. números romanos, utilização do símbolo correto no cálculo.

  • Área Ideognóstica

Dificuldades na realização de operações que envolvam cálculo mental e na compreensão de conceitos matemáticos.

Ex.: relação de grandeza, lateralidade, posicionamento (unidade, dezena, centena), classificar e ordenar.

  • Área Operacional

Dificuldades na execução de operações e cálculos numéricos.

Ex.: Compreensão dos problemas matemáticos, tabuada, quatro operações.


Tratamento

Após avaliações minuciosas, será possível aferir quais as dificuldades específicas podendo desta forma intervir diretamente no problema, por meio de um plano de ação, com estímulos corretos, de forma a prevenir e minorar as consequências negativas destas dificuldades.

1. Intervenção clínica

Na intervenção clínica, após uma investigação criteriosa, é preciso fazer um trabalho integrado com a família e a escola, para que juntos possam mudar a realidade da criança.

Conhecendo as lacunas da aprendizagem que não foram preenchidas, será traçado um plano de ação, com Exercícios e Estímulos adequados.

Considera-se também o pensamento da criança, de modo que possa transformar o conhecimento implícito em conhecimento explícito. Esta ação de pensar sobre o pensar, o que chamamos de metacognição, auxilia a criança a adquirir uma consciência em compreender o que está fazendo, como foi feito e por que foi feito. Esta habilidade poderá ser desenvolvida por meio de diferentes estratégias e tarefas educativas, que possam estimular o pensamento.

2. Importância dos jogos na intervenção

A metodologia de Jogos Matemáticos é uma alternativa para o ensino de matemática que vem se destacando na literatura como facilitadores de uma aprendizagem significativa. Possibilitam a produção de uma experiência para as crianças em termos de conteúdos escolares e para o desenvolvimento de competências e habilidades.

O indivíduo é motivado a trabalhar e pensar ao jogar. Desta forma, ele descobre fórmulas, estratégias para resoluções de problemas, desenvolve seu raciocínio lógico, não somente recebe informações, mas se diverte e aprende brincando.

3. Como estimular desde cedo

O prazer em aprender Matemática não é algo comum a muitas pessoas e algumas enfrentam problemas com ela na fase escolar e até na fase adulta. No entanto, a Matemática assume um papel primordial em nossa vida, pois não se limita a ser uma disciplina onde se ensina a fazer contas e a decorar tabuada. Sem que percebemos, ela está presente em quase tudo o que fazemos, seja em dar troco no mercado, datas de aniversário, quilômetros que percorremos, receita de um bolo, enfim, uma série de coisas do nosso cotidiano.

A aprendizagem da Matemática é um processo moroso, construtivo, em que os conhecimentos vão se integrando gradativamente até que se alcance a assimilação global desta competência. Mas, o que muitos não imaginam, é que este processo começa desde a mais tenra idade.

Desde cedo, as crianças desenvolvem uma matemática informal intuitiva, a partir da estimulação do ambiente, identificando e construindo conceitos, estratégias e formas de pensar. É este conhecimento matemático informal que prepara as bases para a matemática formal que se aprende nas escolas (Casas & Llario, 2002).

 Ao se pensar no processo de desenvolvimento cognitivo de uma criança, não podemos de forma alguma menosprezar o letramento matemático, e as primeiras reflexões que nos vem à mente são:

  • Como a criança aprende Matemática?
  • Em que idade podemos explorar os conceitos matemáticos?
  • Quais os estímulos para um bom desenvolvimento desta habilidade?

As crianças, na primeira infância, antes mesmo de irem para a escola, vivenciam, de forma livre, diversas experiências que as aproximam dos problemas matemáticos. Esse contato com situações cotidianas, muitas vezes, se dá pelas experiências sensoriais e constitui uma série de conhecimentos prévios que, mais tarde, serão ampliados na escolarização.

 Por isso a importância da escola e da família neste processo, pois deverão possibilitar desde cedo um ambiente livre para que as atividades ocorram de forma natural e para que as crianças sejam estimuladas à exploração, desenvolvendo desta forma as suas habilidades com prazer.

A aprendizagem da matemática elementar pressupõe que a criança seja capaz de organizar o espaço que o envolve, de comparar e discriminar objetos, através da percepção das semelhanças ou diferenças entre eles, agrupar os objetos em função de determinados critérios, estabelecer correspondências, etc. (Casas & Llario, 2002)

A família pode estimular deforma lúdica e divertida, por meio de músicas de rimas, contação de histórias, que trazem em seu contexto os números, e brincadeiras simples com objetos do interesse da criança:

  • Usar brinquedos e outros materiais como conchas, tampinhas, figurinhas, pedrinhas, para contar junto com a criança, separando por tamanho, cor ou outra característica.
  • Instigar a pensar sobre o seu tamanho em relação aos objetos, perguntando: “será que você cabe em baixo da cadeira?” ou comparando o tamanho dos objetos, “esta árvore é maior ou menor do que aquela?”
  • Através de uma atividade na cozinha, de culinária, vivenciar ações como como contar, medir, somar, fazer estimativas.
  • Uma forma muito eficaz e prazerosa de estimular uma criança nas habilidades matemáticas é através de jogos de tabuleiro simples que envolvam dados, jogos de cartas, dominó, quebra-cabeças;
  • Uso de brincadeiras como a amarelinha, o boliche, entre outros, pois permitem o desenvolvimento da capacidade de solucionar problemas, criar estratégias, superar desafios e desenvolver o raciocínio lógico.

Referências

Casas, A. & Llario, A. (2002). Las dicultades de aprendizaje en el cálculo.

Piaget, J., (1990). Seis Estudos de Psicologia, Publicações Dom Quixote, Lisboa.

MENEZES, L. Matemática, linguagem e comunicação. Disponível em: http://www.ipv.pt/millenium/20_ect3.htm.

DIAMOND, A. Executive Functions. Rev. Psychol, v.64, p. 135-168, 2013.

GOLDBERG, E. O cérebro executivo: lobos frontais e a mente civilizada. RJ: Imago, 2002

Boaler, Jo. Mente sem barreiras: as chaves para destravar seu potencial ilimitado de aprendizagem. p. 79 – 83. Porto Alegre: Penso, 2020.

Luciene Stivanin

Fonoaudióloga
CRFa 2-14385

• Fonoaudióloga USP
• Doutorado em Ciências da Reabilitação USP
• Pós Doutorado na área de Fonoaudiologia Educacional USP
• Atuação em linguagem, aprendizagem e cognição

Neusa Bacchini

Pedagoga/Psicopedagoga

• Pedagogia pela Universidade Luterana do Brasil – ULBRA (Rio Grande do Sul)
• Especialista em Docência do Ensino Superior pela Faculdade Campus Salles
• Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional pelo Centro Universitário São Camilo – SP

Simone Souza

Pedagoga

• Pedagoga – Universidade Estadual de Londrina – UEL
• Especialista em Supervisão e Orientação Escolar – UNIVALE
• Psicopedagoga – Universidade Presbiteriana Mackenzie

Ana Cintia Diosti

Pedagoga

• Especialização em Psicopedagogia – Universidade Anhembi Morumbi
• Especialização em Neurociência Aplicada à Educação – Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo
• Especialização em Orientação Educacional – Faculdade de Educação São Luís

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